Notas de segunda-feira: o fim-de-semana

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Sou um cidadão atípico, às vezes parece que me construí a partir dos meus próprios actos, uma auto-construção cheia de erros e definindo vias de desenvolvimento inverosímeis. Apesar disso, sou um burocrata competente e abafei quase totalmente o lado temperamental que ninguém, na devida altura, domesticou. Assim, nunca soube bem o que significava o fim-de-semana, ou melhor, ignorei sempre as euforias dos dois dias que cortam, num armistício social e emocional, a série do labor, desse estar no mundo para trabalhar. Isto ou me ilustra como um workaholic inveterado ou um hedonista sem juízo. Em boa verdade, não sou nem uma coisa nem outra. Estou no limbo, sou um ser do “entre”, não tenho qualquer território determinado, nem geográfico, nem discursivo, nem vital. As minhas tautologias são dinâmicas, o meu solipsismo, embora íntegro, está cheio de exteriores, tenho um fogo interior que tanto me ilumina como me devora. O que faço mistura prazer e dever, trabalho e festa (mesmo quando festejo sozinho, a maior parte das vezes). Se escrevo fisiologicamente ao fim-de-semana é porque passei a semana a catalogar palavras e frases. O meu calendário é impecavelmente disforme, revelando-se sistematicamente como a-sociológico, talvez a-psicológico.

Hoje é segunda-feira, milhões de indivíduos foram freneticamente atirados para a rua, logo ao despontar da aurora – e não há nenhuma poesia nisto. Eu não fiz qualquer intervalo, vivo no eterno retorno. Mas sou abanado de todas as formas, sem piedade. Seres sonolentos prontos a explodir conduzem ao meu lado, julgam-nos adormecidos e inofensivos, mas eu sei que ao mínimo contratempo vão dilacerar alguém.