Tirbuson

Eu tinha um saca-rolhas, para as garrafas de vinho. Ainda me lembro da cor. Era Bordeaux. O tom escuro de vinho tinto que me agrada tanto. Não tenho a certeza se essa cor muda com o tempo. Isto normalmente é o que acontece com as pessoas. Quero dizer, o tempo muda as pessoas. O pior é que não me lembro como me veio parar às mãos, se foi um presente de um ente querido. Lembro-me que uma vez vi uma faca pequena numa loja velha numa rua chuvosa. De um lado da faca estava escrito: “Talvez a minha dádiva seja uma que é pequena, mas tem cuidado porque se a perderes, vais perder-me a mim também.” Mas eu estava a falar do meu saca-rolhas, o meu primeiro e o único – até aqui – Tirbuson. Não me lembro se o comprei à pressa para abrir uma garrafa de vinho no Verão. Talvez este saca-rolhas me tenha pertencido só porque tive pressa de provar vinho com amigos ou com alguém de quem gostava, mas já não me lembro quem eram. Esta é a minha pena. Nem sequer me lembro se o encontrei na rua, esquecido por outro pessoa ou se o agarrei como um troféu de guerra. E se era uma relíquia de família? No caso de ser “um prémio de bravura”, gostava de saber em que guerra participei. Será que a venci para receber este tesouro? E se sim, quem eram os meus inimigos? Que lado era o certo? Espero que o meu fosse o certo, para que não tenha insultado a vontade de certos deuses zangados.

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