Declínio do possível, café filosófico

Gilles Deleuze, antes de 1956, por michel tournier

No dia 18 de novembro houve mais um café filosófico na livraria Snob, em Lisboa. Deixo aqui o texto de apresentação e o áudio.

«No próximo Café Filosófico, mistura sustentável de conceitos e de postulados do quotidiano, falaremos sobre o possível, ou melhor, as categorias, filosóficas e não filosóficas, do possível. Se quisermos traduzir este último sintagma numa linguagem mais militante, talvez possamos escrever a seguinte pergunta: terá o mundo, agora totalmente fabricado por nós (Antropoceno), esgotado os possíveis, como quem esgota um qualquer recurso natural?

Evocaremos, e invocaremos, Gilles Deleuze, um filósofo do possível, porque trabalhou este conceito perspetivicamente, analisando-o, e usando-o, a partir de vários ângulos, acompanhado por Kierkegaard, Bergson, Nietzsche e, entre outros, Tournier. Inscrevendo-o na arte e na filosofia, mas também, sem gritar, na política. Daremos conta do filósofo do futuro nietzschiano, cuja obrigação é construir possíveis que intensifiquem a vida, o viver; bem como da intuição do autor, originada em parte na filologia, sobre como a vingança anula os possíveis que propõem um futuro sem ressentimento. Michel Foucault, num livro editado há pouco tempo em França, Le discours philosphique, também defende, ele que se interessou mais pelos sistemas das ideias e dos pensamentos, que a filosofia serve essencialmente para inaugurar o futuro.

Discutiremos igualmente as modalidades éticas que exigem uma responsabilidade pelo futuro, e com isso uma prudência na inauguração de possibilidades que, como na hybris grega (essa embriaguez desmedida, que autoriza, ou força, as maiores transgressões, como a de Édipo), seriam desafios demasiado pesados, ou simplesmente sopros estéreis, para as futuras gerações. Tanto mais difícil quanto a inflação narcísica atual (vivemos também no egoceno) forjou o quase conceito de síndroma de hybris, uma patologia que infeta cada vez mais pessoas, com muito ou pouco poder, bastando-lhes acreditar que, num determinado momento, são todo-poderosos.

Terminaremos com o estado da arte da utopia, desses não lugares onde cabem todos os possíveis.»