CONDOMÍNIOS FECHADOS

Os condomínios fechados erradicam
as tabacarias diante das janelas
e os horizontes de becos à beira-mar.
Os prédios repetem-se, as sombras
parecem-se: são todas de homens.
Os gestos imitam-se e não há
mistério no mofo que se alastra
pelas paredes – provavelmente
foi um cano que se rompeu
e o zelador está sempre pronto.
O tempo não sangra. O instante
não alcança a crise: cristaliza-se,
multiplica a luz, os dias –
sou o de ontem, desde sempre.
Diante de qual parede esperar
a porta que não irá se abrir?
Se ao menos isso fosse claro.
Onde a criança que come chocolates?
Estão todos mortos, alheios, opacos.
São todos o universo a cair
sobre mim com um terror de fábula
infantil: leio sobre nebulosas,
sobre o brilho infindo dos quasares
e que jamais existiu um tempo
antes do tempo e então olho para o corpo
que ao lado dorme e penso
é mentira que exista amplidão maior
do que a do dia poeirento.
A noite continua. Queria
o meu coração fora de mim
apenas para dizer: é o luar,
é o rio em que os homens
lançam os seus excrementos
e os seus mortos mais queridos.
Mas não, o meu coração é ainda
menos do que um pássaro enjaulado;
é uma névoa apenas visível
em noites de puro espanto.
Abro a janela. Procuro o Esteves
para dizer Adeus, mas não, tudo
o que há diante da janela é o gato
vadio que dorme junto aos cactos.