Três tempos sobre uma praça vazia

Quem confundiu os três tempos

com uma praça vazia deixou desperta

a cidade de um cinzel ou de um escultor

que esculpiu letra a letra uma esfinge

mas ela desta feita não devorava homens

sorvia almas a três tempos como se

a humanidade adormecesse sempre

prostrada e quem confundiu a praça

despida de páscoa ou os ramos caídos

nunca se preparou para o sorriso da estátua

nunca se preparou para uma rota no deserto

e nunca viu uma planta a três tempos

uma roseira ou um acanto ou um papiro

que nunca puderam rasgar a secura

da tua voz que declamava areia e pronunciava

enigmas de praças agora sim silenciosas

como pequenas sombras sem graça ou escuras

como sempre fingiram os planaltos quando

quando os profetas lhes reclamavam a altura

a três templos três tabernáculos tu nunca

tu nunca confundiste a noite com os teus joelhos

mesmo que eles nunca repousassem sobre lajes

três tempos    reclamavas     a tua língua vermelha

descansava na boca a imaginação do céu

e de lá vinham sussurrantes os últimos planetas

e eu decorava os seus nomes ou melhor

decorava o último dos três     o que num lamento

morreu da minha infância agora agora

que vejo a praça vazia não espero vestes

vestes brancas ou anjos ou esfinges agora

prostrado sou eu que pergunto que animal

que animal tem três valsas e nunca se despede

nem quando a terra o cobre com o esquecimento

que eternidade tem essa alma que vive

mesmo que a escuridão da praça vazia

o convide ao pó e à sombra mesmo que

ainda que todo o silêncio seja provisório

mas já tu me preparas a esfinge     a afias

a embotas     a tornas macia     manejável

já tu de dia lhe chamas uma história     a aninhas

a acalantas com pequenos gestos de acanto

e logo no deserto as raízes procuram não a água

mas três tempos de praças vazias sem que nunca

nunca se tivesse perguntado o que faremos

de todo este espaço quando apenas os nossos filhos

os nossos tristes filhos andarem por cá o que será

dessa escada que construíste em madeira

e que nunca levou a lado nenhum    apenas sabia

o que será de nós    os mortos    quando confundirmos

a praça vazia com a solidão do tempo

nem que fosse em valsas de mil tempos

e nunca me apercebesse de ti no deserto

o que será de nós quando a areia chover

e a água nos cobrir de tempo o que será

da esfinge quando dela restar apenas o enredo

o que será dos que confundem a lentidão

com os três templos arrependidos os três

os três tabernáculos o que será de mim que pergunto

a mais humana das perguntas    se és tu

e vejo estarrecido uma esfinge degolada

a mil tempos    isto é   todos os romances escritos

de todas as praças vazias.