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“It took me a really long time to realize that

art is actually a process of removing anxiety”

Jeff Koons

Ninguém tem culpa
ouvi ao passar pelo corredor.
As duas falavam mal de alguém
mas não sabia quem.
(falar mal aqui sempre foi natural
mistura de alguma razão com frustração). Entrei.
Demorei a escolher o livro
ia da parede da pintura
à parede da poesia sem me decidir.
Demorei sim demorei
mas lá escolhi o livro certo. 

Já está? Vai demorar muito mais?
Tem de se despachar!
E na cabeça de quem dizia isto
vinham as imagens prensadas de pressões diárias
e os momentos de humilhação
sair às 8h em vez das 7h
ouvir o evento R, T, S, X, Y sem interesse
aturar a birra de um ou outro luminoso astro
que por ali passasse com muita pressa.
Sou ia dizendo para os seus asseados botões
uma lutadora Luto todos os dias por esta
cadeira que é minha.
Tenho de afastar estas tipas pois ninguém
me roubará o lugar
o meu ganha pão de boa secretária
obediente
(um girassol murcho)
A escrava segundo alguns
A passiva-agressiva segundo outros. 

Compreendi o Ninguém tem culpa
 a culpa daquela eterna irritação. E esse raio
permitiu-me entre o já está e o
despachar
conter a minha língua de loira agressiva
antes de disparar em flecha alguma
palavra afiada
e ser outra vez uma mera mal educada.

 Sim todos temos culpa
culpa dessa exploração
culpa por só pensarmos no livro
antes de te dizermos Bom dia
de irmos a correr na busca incessante
(que não levará a nada)
do paladar do saber poético
e negarmos-te
provavelmente
a mais uma pausa merecida
em silêncio
num dia esgotante
a arrumar livros cheios de pó
entre a tua insatisfação e a tua rinite alérgica.


Barbara Stronger
23.02.19

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Jac Leiner - “Hip-Hop book”, 1999-2000.