Selima Hill, Charlotte

Tradução de Hugo Pinto Santos

Ela vem até ao jardim
trazer para dentro a roupa estendida.
Eleva os braços

até às camisas do marido
como devota e logo
produz um belo monte com elas.

Asas, velas, cúpulas,
estais dobradas e
prontas para o ferro...

E ei-la agora, pacificada,
com a frigidez da roupa
aninhada nos braços.

Selima Hill, London Review of BooksVol. 4 No. 4 · 4 March

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Selima Hill, Alfaces

tradução de Hugo Pinto Santos

Este poema é um poema sobre ti.
Vou deitar-te sobre a cama
e tudo o que tu tens de fazer é ouvir.

Sento-me ao teu lado na cadeirinha.
E é, de facto, aqui que o poema termina –
precisamente quando estou prestes a perdoar-te.

(Este poema está a ficar cada vez mais pequeno.
Era um poema sobre alfaces.
Era verde luminoso e irreprimível.)

Selima Hill, Trembling Hearts in the Bodies of Dogs: New and Selected Poems, Bloodaxe Books, 1994

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Selima Hill, 'Posso, por favor, ter um homem '

Tradução de Hugo Pinto Santos

Posso, por favor, ter um homem que use bombazine.
Posso, por favor, ter um homem
que saiba 100 nomes diferentes de  rosas;
que não se importe com os meus coelhos distraídos
 que vagueiam por aqui e por ali
como se fossem donos disto,
que me faça um caril cremoso com erva-cidreira fresca,

que caminhe como Belmondo em A Bout de Souffle;
que pendure todos os meus postais cuidadosamente selecionados -
mandados de cidades exóticas
às quais ele não espera ir comigo,
mas aonde iria se lhe pedisse, o que farei -
com mais niguém, na parede do seu quarto,
a começar por Ivy, o Famoso Porco Mergulhador,

de cujo retrato, em acção, comprei dez cópias;
que também fale como Belmondo, com lábios tão suaves
e tão firmemente desenhados como botões de peónia
cobertos de chocolate (chocolate fundente);
que saiba que postar-se ébrio sobre mim
como um edredão com estofo de livros da biblioteca e sacos de compras
é muito fácil: posso, por favor, ter um homem

que não esteja disposto a fazer isso.
Nem esteja disposto a dizer-me que estou bonita.
Que, quando eu saio apressada da casa de banho,
como um leitãozinho aprumado,
que não quer mais do que uma pândega
de afecto e indisciplina, sem complicações,
abra os braços como uma gamela para eu mergulhar. 

Selima Hill, Violet, Bloodaxe, 1997

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Os Caçadores de Aves dos Pântanos

Tradução de Hugo Pinto Santos

Há três mil anos,
caçavam aves nos pântanos
em torno de Tebas – homens com saios enredados
e colares de faiança dispostos em camadas,
que evitavam o crocodilo castanho,
e adoravam a íbis, que perseguiam
com longos gatos riscados presos por um fio,
sob o olhar de Nut, deusa do céu.

O estranho mundo sussurado da minha mãe é assim:
ela assombra-o como os caçadores de aves dos pântanos,
vai alegremente pé ante pé pela história, sustida por deuses
que me são tão estranhos como a Senhora Nut ou Anúbis,
o oracular, mascarado de chacal.
Quando a vou buscar à estação, digo
Olá, mãe! e penso Olá, Thot,
Esta é a Pesagem do Coração.

Selima Hill, Trembling Hearts in the Bodies of Dogs: New and Selected Poems, Bloodaxe Books, 1994

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