Dois Livros

I

Valha-nos a clorofila!

Rectificação da linha geral (2020)

     Queria começar por contar uma pequena história, ocorrida em 2016. Quando andava a mudar de casa, para a atual morada onde vivo, resolvi despachar uns quantos livros de poesia que só faziam volume na estante. Leituras que pouco ou nada acrescentaram ao que já tinha lido, livros que não precisava e que não me encheram a alma. Nessa limpeza foram, entre outros, dois livros de José Alberto Oliveira – Tentativa e erro (capa dura e relativamente caro naquela altura, pelo menos sempre assim achei) e Como se nada fosse (este comprado nos Açores, em férias).  Até que no ano passado, em 2019, De passagem ficou nos destaques principais da poesia, como um dos melhores livros do ano. Uma surpresa! E dei-me a sentir-me culpado por não ter lido o poeta com a devida atenção, pensei.

     E, assim, quando saiu Rectificação da Linha Geral (2020) (capa tão bonita! Como as da Língua Morta (x)) dei por mim a comprar o livro e a lê-lo, desta vez, com a máxima atenção possível. Era eu a dar outra “hipótese” a tão maltratado poeta, maltratado por mim, entenda-se. E foi, assim, que nestes últimos meses fui lendo o livro com calma. E venho, aqui, deixar as minhas impressões. Não mais do que meras impressões, porque não sou crítico literário nem recebo para isso. Mas antes de avançar, queria dizer algo que toda a gente já sabe, a redução da qualidade a pique da Assírio & Alvim, no que toca a apresentar novos autores. Quem ler isso dirá que não, não é verdade, pois a editora publicou “maravilhosos livros nos últimos anos”. Não, não é verdade. Há exceção do livro da Ana Luiza Amaral e do recém-publicado livro de Jorge de Sousa Braga (autores nascidos na década de 50), a editora tem sido uma desgraça. Terá com certeza, os seu problemas, mas é um facto, a progressiva “decadência” da editora. Pois não soube introduzir no seu catálogo jovens poetas mais interessantes. O que tem salvado a editora, parece-me, são as reedições (agora Rilke) e os tijolos, muito pouco práticos, das antologias de Cesariny, Sophia, Botto, por aí. Parenteses à parte, voltemos a Rectificação da linha geral. E aqui começa: Rectificação da linha Geral não é exceção na linha que cai a pique da Assírio & Alvim.

      O livro com 143 páginas poderia ser reduzido a 50 páginas; o mesmo é dizer que quase metade dos poemas merecem o caixote do lixo. O título demonstra uma presunção, uma que o interior vem a confirmar. Segundo o título/poeta é preciso “corrigir” a linha geral que corre na poesia. É nessa presunção e arrogância que o poeta se acha no dever de corrigir aquilo que está mal. A começar pela poesia dos mais jovens, parece-me. Pelo menos é esta a leitura que faço do título. E são várias as passagens, de uma ironia e sarcasmo, que apontam para este sentido.

    Com este livro ficamos a perceber o que anda a “malta de 68 anos” a fazer, é simples, reduz-se a três coisas: a) ver notícias (telejornais, notícias sobre tudo e mais alguma coisa); b) a preocupação da doença (convém fazer o levantamento das mazelas e doenças presentes, coisa que não fiz) e c) exercícios de “elegante retórica”, tão elegante que não me passa ao lado. E, assim, nesses três pontos fica arrumado o livro. Mas, não direi que o livro é mau. Não, não direi. Medíocre também não, o poeta não merece tanto. Merece, sim, três estrelas, “um travesseiro” e um pontapé no cu (esta frase vai servir para a minha candidatura a uma bolsa da Gulbenkian). [Aqui, abre-se outro parenteses, para dizer que quem está a dar o pontapé são estas notas e não eu; tenho educação para dar e vender!]. Pior só mesmo Manuel Alegre, mas todos já sabemos disso.

      Há no entanto, poemas que gostei muito, são disso exemplo os da página 42 e 43, sendo o da página 43 o poema “Novembro (Les três riches heures du duc de berry)”, um dos mais bonitos, senão o mais bonito. Um poema ecfrástico à pintura que vem na capa, onde vemos uma personagem masculina com um só olho (dado importante – monóculo- como parece ser este poeta) e que parece atirar aos porcos bolotas, ou pelo menos, a dirigir-se aos porcos. A imagem e o título, assim, como o conteúdo de muitos desses poemas, aponta exatamente para isso, para a arrogância do poeta que chegado aos 68 anos, se acha no dever de “Corrigir” toda uma “Linha Geral” da poesia, como se ela existisse como corrente uniforme. O poema da página 43 revela que este poeta terá mais sorte se se dedicar a poemas ecfrásticos feitos a partir de livros de horas. E há imensos por descobrir. Fica a sugestão.

     Dito tudo isto, fica claro que, numa próxima mudança de casa, uma que já se adivinha para breve, este será mais um livro a despachar, a servir de “dádiva envenenada” a um “fiel” amigo.  Mas, convenhamos, talvez sem a página 43, ou ainda sem as páginas de “Academia”, “Instruções” ou “Período Refractário”, dos poucos que realmente se salvam. Aqui coloca-se uma questão: quatro poemas salvam um livro? Acho que sim, mesmo este livro. Nem mesmo a crítica elogiosa no último expresso me fez mudar de ideias, porque para ler notícias sobre a banca e o sistema financeiro basta-me ligar a televisão. Pior do que o tédio em que todos vivemos, fechados em casa, só mesmo esta poesia de quotidiano; longe da fabulosa poesia de Edson Russell ou Frank O’Hara.

     Mas, esperemos que, neste final de ano, esteja entre os melhores livros do ano, assim saberemos, definitivamente, que tal se deve à marca da editora e não à pena do seu autor. Coisa que, convenhamos, já todos nós sabemos [Salve-se as exceções]. Que pode um poeta de 68 anos se não escrever o que quer? Espero que o faça, como eu também o faço, mas, se possível, com maior ironia e sarcasmo, com mais sal e menos telejornal.

II

“a brilhar e-/ternamente”

Matéria negra e outros poemas (2020)

       Comecei a ler Jorge de Sousa Braga pelos 20 anos, quando andava ainda pela Ribeira Grande, Açores. O Poeta Nu, edição de 1997, foi um dos livros mais reveladores que li naqueles anos lá na ilha. Ficou-me sempre como um dos mais importantes livros de poesia alguma vez lido, a par de Musa irregular de Fernando Assis Pacheco e O Virgem Negra de Cesariny. Três livros lidos antes dos 20 ou 22 anos em S. Miguel. Entre os três o humor, algo que sempre gostei na poesia, é inevitável, com diferenças é claro, mas todos brilhantes.

      O poeta Jorge de Sousa Braga não tem publicado, nos últimos anos, como sabemos, muitos livros de poesia da sua mão. Mas tem feito algumas antologias, como é o caso da antologia – Sombras brancas, da Língua Morta. Pelo que sei, o seu último livro de inéditos data de 2012 – O Novíssimo testamento, onde podemos encontrar logo à entrada do livro o melhor poema desse livro, o respetivo Testamento. Por isso, quando apareceu este livro nas livrarias, não só foi uma novidade para mim, como arranjei forma de o adquirir o mais rapidamente possível, mesmo no estado de quarentena. Para isso, usufruí dos serviços da livraria Flâneur, que tem feito um extraordinário trabalho de entrega de livros ao domicílio. Publicidades à parte, queria dizer isso para falar do meu entusiasmo sempre que sai um livro de Jorge de Sousa Braga. Ora, depois de uma primeira leitura não consigo deixar de dizer que o livro é de facto extraordinário e veio ao encontro das minhas expectativas. É de facto um belo livro, talvez ainda melhor que o seu anterior - O Novíssimo Testamento.

     O livro divide-se em duas partes: a matéria escura propriamente dita, e os outros poemas. Nesse livro é evidente o fascínio de Sousa Braga pelos bestiários, nele povoam diversos animais como gatos, o priolo, os ursos-d’água, peixes, galinhas, etc. Há também, sobretudo na segunda parte, e dando continuidade a aspetos de “O novíssimo testamento”, a reescrita de episódios bíblicos, é disso exemplo o bonito poema “A última ceia”, uma reescrita do episódio da última ceia de Cristo. Curioso é lê-lo nos dias de hoje, vejamos os primeiros versos: “Havia mais doze lugares à mesa e estavas sozinho/ Uns não puderam aparecer porque houve greve dos comboios”. Poema que parece pressagiar os tempos que correm.

     Mas voltemos à primeira parte do livro, a que dá origem ao livro – A matéria negra. Quando iniciamos a sua leitura damos conta que o ritmo do poema tem excessivas paragens, quero com isso dizer que o texto é feito quase todo com frases declarativas que se sucedem umas às outras, sem, contudo, perder o seu valor poético. Algo que, de certo modo, me fez pensar em William Carlos Williams quando comecei a ler e que, depois, foi ao encontro da nota no final do livro: “o primeiro poema (…) é uma espécie de colagem, a que a matéria escura tenta dar sustentação”. Este é o grande poema do livro com passagens como estas: “Prevê-se que no futuro aconteça uma colisão com a Andrómeda/ mas ninguém está preocupado com isso” ou “Eu sou um planeta errante que não está na órbita de qualquer/ estrela e flutua livremente no espaço sideral”.

     Em lato censo, podemos, creio, centrar o livro em dois temas essenciais: o voltar a olhar as estrelas (regressar ao universo, o mesmo é dizer, olhar para aquilo que nos é superior em dimensão) e o respeito urgente para com os animais e planeta, ou seja, olhar para o que nos rodeia ou nos é “inferior” em dimensão. Depreende-se, nesse livro, a necessidade de repensar o lugar do Homem no contexto do Universo. Ou seja, Jorge de Sousa Braga traz ao de cima a nossa insignificância enquanto espécie e diz-nos, no final de “A matéria escura”: “E estamos a caminho do desastre/ ou das estrelas”. Estes dois versos finais de “A matéria negra” podem espelhar as duas partes do livro: a primeira parte – as estrelas; a segunda parte: o caminho do desastre. Unificando tudo isto, está a matéria negra, que, segundo nos diz Sousa Braga “sem a matéria escura    viveríamos num universo sem enxames/ sem galáxias sem estrelas sem pessoas”.

     O ano não terminou, mas creio que, até agora, este é o melhor livro do ano, dos que li, obviamente. Este, sim, merece já estar em alguma lista. E, claro, merece uma segunda e terceira leitura, por mim e por outras pessoas com outros olhos e outra sensibilidade, pois é um livro que exige ampliação. Mais do que rico palavreado, este livro requer sensibilidade a quem o lê. Um livro a brilhar no escuro, ternamente e eternamente. Recomendo vivamente. 

notas Março, 2020

 

AREIAS e outros grãos

“ele fala/ para a areia/ que lhe enche a boca”

Johannes Bobrowski

AREIAS

 

*

Serpente de ferro negro

correndo na frieza do

mar

traz-me a perdida pele

do meu longínquo verbo

amar


  *

Alga de sulcos veste

a mais pequena dor

lava

a mão dormente da

rede do pescador

e

louva

 

*

Cerca de terra e trigo

desmente a pérola do

rio

para que se incha nas

nas margens o junco e

o

fio

 

*

Sargo peixe de prata

corre além da fragata

ata

a curva que te rebaixa e

na espuma traz a pluma

que te

mata

 

*

Areia monódica de fino

e opulento grupo risca o

chão

em branco círculo de giz

Ir além dá trabalho assim

dizem

não

 

DESIQUILÍBRIOS DA SOMBRA

 

Do Sol ao Inferno

Do Grande ao Sofrível

Do Belo ao Vómito


  Por outras palavras…


 De Madalena a Melícias

De Isabel a Lemos

De Faria a Gesta


  …a meio ficou a aresta.


SEM JEITO PARA O NEGÓCIO

 

E o coro canta no

tempo em que os ratos

em medo

saem dos buracos

das paredes revestidas de estantes

ratos pequenos ratos velhos

alguns vermes muitos vermes e

o coro canta.

 

Sentada

a máquina tenta sobreviver

gerir o medo na penumbra.

Corre em penoso som a flor da peste

e todos leem poemas para o

confessionário Universal.

Nenhum tem jeito mas todos

têm perfil para o negócio.

 

O coro canta imparável

a futura sobrevivência

de quem sabe fazer negócio.

Tristes pavões sem grandes penas

julgados por quem vos vê.

 

Bobos da nova era

tudo será esquecido

sobretudo os nossos nomes.

Michaël Borremans , mercy 2016.jpg

Michaël Borremans - “Mercy”, 2016

No Cemitério de Vila Formosa

No Cemitério de Vila Formosa a terra é cor de tijolo, os mosquitos são famintos

Mesmo com trinta graus e o Sol é húmido de inferno e cólera,

Demorei trinta anos a visitar-te e agora vejo este monte de terra quente,

Com um cata-vento vermelho e verde, que roda às vezes,

Mesmo sem vento e tu sorris de uma foto pequeníssima,

E comove-me a forma como a tia arranca uma erva daninha,

Com o mesmo cuidado de quem tira um cabelo solto da cara de alguém,

Rega as plantas porque não te pode dar um abraço,

A morte dói só aos vivos quando o amor permanece,

Apesar da humidade do ar, aquele calor é doloroso como metal,

A minha prima soluça, não consigo deixar de olhar para aquela terra estranha,

Onde passarás o resto dos dias que já não te restam,

Custa-me esta distância, o pouco que me ficou de ti, um gelado esmeralda,

Um carrinho de brincar, o sorriso que parecia dizer que tudo está bem,

Segurando uma g3 numa foto da tropa, um monte de terra vermelha,

Entre milhão e meio, no mato rodeado por uma floresta cinzenta,

Contudo, o Cemitério de Vila Formosa, não será a tua última morada,

Essa será naquele ente último a lembrar-te ou este poema.

Turku

20.03.2020

Tu; Feriado

Tradução: João Coles

TU

Quando a vida se enrodilha sobre si
e não encontra a cauda,
quando em volta te olhas e não há nada,
quando tens fome,
quando não sabes o que fazer,

és verdadeiramente tu.

Quando o passado
é uma paisagem fechada num quarto escuro,
um retrato mal feito,
quando a esperança se seca
como um velho tronco morto,

és verdadeiramente tu.

Quando te deténs para pensar, e pensar
é a última coisa que queres fazer,
quando não há lugar nem maneira,
quando não sabes porquê,
quando te tornas incómodo,

és verdadeiramente tu.

Quando todas as coisas são pilares de nada,
um peso cego sobre as costas,
quando a garganta engole a escuridão,
quando tudo está decidido,
e te custa a perpetrar,

és verdadeiramente tu.

Quando o espírito se preenche
de nuvens negras e dos olhos
te caem todas as chuvas,
quando um amigo parte,
e não sabes se queres permanecer deste lado,

és verdadeiramente tu.

Quando a derrota é o único espelho
das tuas tentativas,
quando sob o último golpe
estás em queda e não sabes explicar
porque é que para te ergueres te preparas,
sim,
és verdadeiramente tu.

FERIADO

Vemo-nos à hora em que
o dia se guarda no espírito
e vencido por uma ternura irresistível
se abandona à noite,
minutos que ardem
no topo da cidade,
e toda a luz da manhã
é vertida nos cálices.
Os corpos trampolins de pensamentos
altos e simples como rios,
virados para o mar atrás de cada olhar amigo.
A sede das bocas
não espera resposta,
é forte em abundância,
é uma flor vermelha plantada
no meio de música selvagem,
dá-se em risadas que esquecem
cada momento e cada sentido.
Só saltos e cores,
só acenos e sabores, inúteis e reais,
só o estrondo que fala em segredo.
Pode calhar,
entre pessoas e instantes,
pode calhar veres-me
enquanto desvio
o olhar em direcção a um vazio.
Mas nenhum dos meus pés
se dirige à solidão.
Se prestares atenção,
as escuridões e as angústias do andar de baixo,
que as vassouras batem nos tectos,
têm o mesmo ritmo desta festa,
do passo de dança
que nasceu de uma qualquer queda.
Pois então não te preocupes,
voltei no ar denso de notas e de risos,
na terra que nos assemelha
são vocês os meus navios
nesta viagem sem partida.
De novo o copo vazio,
outro jogo que o mundo entorna,
e, levemente,
à volta das estrelas dos nossos olhos
a escuridão que confunde
as palavras da noite.


TU

Quando la vita si è attorcigliata su sé
e non trova la coda,
quando intorno ti guardi e non c’è nulla,
quando hai fame,
quando non sai cosa fare,

sei veramente tu.

Quando il passato
è un paesaggio chiuso in una stanza buia,
un ritratto fatto male,
quando la speranza è secca
come un vecchio tronco morto,

sei veramente tu.

Quando ti fermi a pensare, e pensare
è l’ultima cosa che vuoi,
quando non c’è posto e non c’è modo,
quando non sai perché,
quando ti sei scomodo,

sei veramente tu.

Quando ogni cosa è un pilastro per nulla,
sulle spalle un peso cieco,
quando la gola inghiotte il buio,
quando è deciso tutto quanto,
e fai fatica a perpetrare,

sei veramente tu.

Quando si riempie di nuvole nere
lo spirito e dagli occhi
tutte le piogge ti cadono,
quando un amico se ne va,
e non sai se vuoi restare di qua,

sei veramente tu.

Quando la sconfitta è l’unico specchio
dei tuoi tentativi,
quando sotto l’ultimo colpo
stai cadendo, e non sai spiegarlo
ma a rialzarti ti stai preparando,
sì,
sei veramente tu.

FESTIVO

Ci vediamo all’ora in cui
il giorno si guarda nell’animo
e da una tenerezza irresistibile vinto
si abbandona alla sera,
minuti che ardono
sulla parte alta della città,
e tutta la luce del mattino
nei calici è versata.
I corpi trampolini a pensieri
alti e semplici come fiumi,
tesi al mare dietro ogni occhio amico.
La sete delle bocche
non attende risposte,
è forte di abbondanza,
è un fiore rosso piantato
in mezzo a musica selvatica,
si dà in risate che dimenticano
ogni tempo e ogni senso.
Solo salti e colori,
solo cenni e sapori, inutili e veri,
solo il frastuono che parla in segreto.
Potrà capitarti,
tra le persone e tra gli istanti,
potrà capitarti di vedermi
mentre mi lascio scappare
lo sguardo verso un vuoto.
Ma nessuno dei miei piedi
alla solitudine è rivolto.
Se presti attenzione
i bui e le angosce dal piano di sotto,
che le scope sui soffitti battono ,
fanno il ritmo alla festa di qua,
al passo di danza
che da qualche caduta nacque.
E allora non preoccuparti,
rieccomi nell’aria densa di note e di risa,
nel paese che ci rassomiglia,
siete voi le mie navi
per questo viaggio senza partenza.
Un'altra volta il bicchiere vuoto,
un altro gioco che il mondo rovescia,
e, lievemente,
intorno alle stelle dei nostri occhi
il buio che confonde
le parole della sera.

O DERRADEIRO POEMA SOBRE O VÍRUS (...)

O DERRADEIRO POEMA SOBRE O VÍRUS

                COM O SUBTÍTULO

            ABRIL EM CHERNOBLY

  Ou será Chernobly em Abril? Não sei,

não sei, não interessa! Este é o derradeiro

poema (quero dizer, Soneto) à vinda

do Birus, do Vírus, do Tirus. Tirus? Sim

vinte tiros (com sotaque do norte) no pé.

Mas pior é ver a Genética com a Estética

(mais alguma palavra que acabe em -ética?)

Bom, eu até procurava no dicionário mais

alguma bonita palavra, mas, confesso, não

me apetece nada ir receber o Camões.

E, sim, este poema, este soneto de cama,

é mau. É, claro, que é mau. Tinha de ser

mau para servir de lupa amplificadora

do vírus que anda por aí em jornais de

duas siglas. Mau até dar com um pau.

                          (até rima, já viram?)

Recapitulemos: este poema, sim, é o

derradeiro poema sobre o vírus. Mas

qual vírus? O da linguagem (Langua

ge is a virus) ou do contente nome?



big-science_04.jpg

Laurie Anderson - O superman, 1982.